sábado, 6 de setembro de 2014

Vettel não dá chances e bota a mão na taça


Não, você não voltou no tempo nem está em uma realidade paralela. Reproduzo um texto que fiz para outro blog sobre o GP da Itália do ano passado. Era a segunda vitória consecutiva de Vettel, numa sequência que chegaria a nove. É um registro interessante, sentir como tudo mudou em um único ano.

***

Deu sono. Vettel venceu com uma facilidade assustadora, sem correr nenhuma espécie de risco. Foi um dia que lembrou os tempos de Schumacher na Ferrari, a bem da verdade.

O único momento em que houve alguma chance de Vettel perder a corrida foi na largada. O alemão, consciente de que tinha o melhor ritmo, sabia que se terminasse a primeira volta na ponta seria o vencedor. Assim o fez: travando rodas e atacando as zebras, não deu chances aos outros. Depois, fez uma sequência de voltas rápidas, para que ninguém pudesse usar a asa-móvel contra ele. E também para mostrar que quem mandava ali era ele. Ayrton Senna fazia muito isso, e tem um número muito alto de vitórias no currículo. Alguma semelhança?

Um pouco atrás o segundo colocado era - oh - Felipe Massa, como quem diz "sim, eu ainda corro". Ganhou duas posições na largada e construiu sua corrida em cima disso. Falem o que quiser dele, mas ele vem largando muito bem esse ano, sendo o piloto com mais posições ganhas em todas as primeiras voltas de 2013. Pena que Alonso vinha atrás e, como se sabe, Fernando is faster than you. Foi pra terceiro. Depois, um pit-stop mediano da Ferrari colocou uma pá de cal nas chances de pódio do brasileiro, que perdeu uma posição para o semi-aposentado Webber. Foi sua melhor corrida em meses, porém.

Alonso fez o que podia, mas ainda assim foi pouco. Chegou a andar no mesmo ritmo de Vettel em alguns momentos, mas isso aconteceu quando já existia uma distância de uns cinco segundos entre eles. No seu caso, o que acabou com suas chances de vitórias foi uma decisão estupida - do próprio piloto - de retardar sua parada, na tentativa desesperada de buscar o líder. Claro, no fim das contas só perdeu tempo, ficando umas três voltas com um pneu bastante gasto.

Atrás, algumas brigas interessantes. Hamilton e Räikkönen tiveram problemas e foram forçados a fazer mais uma parada, tendo que se entreter fazendo corridas de recuperação e chegando em nono e 11o, respectivamente. As McLaren's, no dia em que comemoravam os 50 anos da equipe, tiveram um dia trágico, em que quase não pontuaram e levaram surra de outras equipes medianas, como Toro Rosso e Sauber.

Falando em Sauber, foi o final de semana do ano da equipe suíça. Largando em terceiro, Hülkenberg conseguiu se manter numa excelente quinta posição, somando numa só corrida mais que o dobro do que conseguira em todas as outras. Se consolida na oitava posição do mundial de construtores, tendo em vista que a Williams não dá sinais de que vá conseguir reagir em 2013.

Vettel está com oito dedos na taça. Com 53 pontos a mais que Alonso e 7 corridas pela frente, as possibilidades de reação são muito baixas. Fernando vai continuar dizendo que está na briga e que "nunca desiste". Balela. Deem logo a taça para o alemão.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Um dia no passado - A arrancada da Williams para o título que não veio


A temporada de 1994 foi única. Foi um ano de transformação e renovação, mesmo que forçada, para a F1. Após a morte do último piloto restante do quarteto Piquet-Prost-Mansell-Senna, nomes como Michael Schumacher e Mika Häkkinen viram caminho livre para brilhar na segunda metade dos anos '90. Como todos sabem, o ano acabou com manchas de sangue sobre a competição. Isso não significa que tenha sido um ano absolutamente péssimo. A briga pelo campeonato dessa temporada foi uma das mais apertadas de todas.

A Williams, depois de meses de depressão pós-Senna, via a Benetton brilhar com seu pupilo Schumacher. Foi difícil para a equipe de Frank voltar à disputa com seu piloto sobrevivente, Damon Hill, mas a capacidade do FW16 e a suspensão de Schumacher serviram para equalizar a disputa. Em Monza, 11a etapa do campeonato, podemos dizer que a disputa começou a esquentar de verdade.

Falemos sobre o 65o GP da Itália, então.

A classificação trouxe algumas surpresas. O rendimento das Benetton's foi pífio, com Verstappen segurando apenas uma 10a posição, totalmente fora do ritmo esperado de uma equipe que dominara a primeira metade do campeonato. Lá na frente, Herbert fez o melhor treino da Lotus em anos, garantindo uma quarta posição. A dobradinha da Ferrari, a exemplo de Hockenheim, veio numa pista de altíssima velocidade, que compactua com o monstruoso V12 de Maranello. Só que, dessa vez, com Alesi na frente, conquistando sua primeira pole. Damon Hill, tentando se aproveitar do gancho de Schumi, largava em terceiro, com Coulthard escoltando em quarto.

Barrichello, esperança brasileira, largaria em 16o; Christian Fittipaldi, em 19o. Ambos foram batidos pelos companheiros de equipe, Irvine e Morbidelli.

Esperança rossa
Os dez primeiros seriam ALE-BER-HIL-HER-COU-PAN-HAK-DCE-IRV-VER

Logo na largada, muita encrenca e confusão: Irvine freou insanamente tarde e acertou a traseira de Herbert, complicando também a vida de Coulthard, Panis e Barrichello. Bandeira vermelha, para desespero das Ferraris, que haviam arrancado com primor. O irlandês iria relargar em último, enquanto Herbert teria que fazer o procedimento nos boxes. Basicamente, Eddie acabou com a única chance real da Lotus de pontuar em 1994 logo na primeira curva do GP. Paciência.

Na segunda largada, alguma normalidade: Alesi e Berger mantiveram a ponta com Hill, Coulthard, Häkkinen e Katayama logo atrás. Barrichello foi muito bem e assumiu a 9a posição, assim como Fittipaldi, 13o. Morbidelli bateu sozinho na Curva Grande.

Curiosamente, dois furos de pneus marcaram as voltas seguintes. Zanardi e Verstappen foram atingidos na reta oposta. Diz a lenda que, durante a madrugada, algumas pessoas meio alteradas jogaram garrafas de vidro para dentro da pista, justamente no trecho em questão. O asfalto foi varrido, mas não tinha como ficar 100% limpo. Felizmente, ninguém mais foi afetado. E vocês reclamando da Pirelli...

Na ponta, Alesi faz a corrida da sua vida. Vai abrindo vantagem sobre Berger, se encaminhando para uma estratégia de dois pits. A Tyrrell teve a mesma ideia para seus pilotos, Katayama e Blundell, que voam em solo italiano. O motor Yamaha rendia bem em pistas de alta velocidade, mas acabava consumindo muito combustível. Não era o maior dos problemas, já que Ukyo não enfrentou problemas para passar a McLaren de Häkkinen. Foi algo tão surpreendente que levou Galvão a dizer que o japonês era a "revelação do ano". Mais atrás, seu companheiro vinha escalando o grid, buscando pontos. Todavia, pit-stops lentos jogariam a dupla para trás.

Na 14a volta, Alesi entra nos boxes com 10s de vantagem sobre Berger. O pitstop, rápido, foi o último momento do francês na corrida: um problema na embreagem impediu Jean de voltar à pista. O sonho da primeira ficava pelo caminho e só seria realizado um ano depois. Gerhard, novo líder, vinha com Hill e Coulthard no cangote. O austríaco aumenta o ritmo imediatamente e tenta garantir que o troféu não saia da Península Itálica.

O brasileiros vão fazendo, pouco a pouco, um progresso considerável. Os abandonos, constantes, vão levando a dupla para a frente. Na volta 22, Barrichello já é quinto, enquanto Fittipaldi é 7o.

Então os pit-stops começam com tudo. O primeiro foi Berger, atrapalhado por Panis, retardatário, que ia em direção ao box da Ligier. O tempo perdido cobraria um preço alto. Hill entrou na volta seguinte e voltou à frente do veterano. Não parou aí: Coulthard, que vinha atrás dos dois, fez uma parada ainda mais rápida e voltou na frente de Damon e Gerhard. O escocês passou a ser, na prática, o líder do GP!

Na volta 28, a ordem era COU-HIL-BER-HAK-KAT(!!!)-BAR

Surpresa do dia
A felicidade de Coulthard não duraria muito, todavia. Frank Williams deve ter mandado alguma mensagem pelo rádio e Hill assumiu a ponta sem maiores resistências do escocês. Mais atrás, as Tyrrells davam uma festa a parte: Katayama ultrapassava Häkkinen pela segunda vez no mesmo dia, enquanto Blundell passava Barrichello e entrava na zona de pontuação. Para a dupla, passava a ser uma questão de andar o mais rápido possível e fazer valer a estratégia de dois pits.

Só que andaram muito rápido. Blundell rodou sozinho, passeou na brita, mas conseguiu voltar. O carro, porém, já não era mais o mesmo e o destino foi o abandono. Não muitas voltas depois foi a vez de Katayama, que ficou sem freios na Lesmo e encontrou a barreira de pneus. Um dia decepcionante para Ken Tyrrell, que via sua outrora gloriosa equipe agonizando em dívidas e decadência.

Assim, na volta 46 as posições eram HIL-COU-BER-HAK-BAR-BRU. Os dois primeiros vinham colados, enquanto Berger apresentava um ritmo forte para tentar garantir alguma alegria para os Tifosi.

As últimas voltas foram cruéis, em termos de abandonos. Christian Fittipaldi, após uma corrida sólida, parou com problemas no motor. David Brabham e Olivier Panis enfrentaram destino parecido. Mas com Coulthard foi trágico.

O escocês vinha fazendo todos os esforços para acompanhar Hill, talvez impressionando a equipe que tinha decidido colocar Mansell no volante do FW16 para o fim do campeonato. Mas passou dos limites: na Parabólica, última curva da última volta, uma pane seca jogou no lixo a fácil dobradinha. Acabou sobrando um decepcionante 6o lugar. Se é pra fazer isso, pelo menos Nigel anda mais rápido e é mais divertido.

A corrida acabou com HIL-BER-HAK-BAR-BRU-COU.

Era o começo da reação de Damon Hill que, beneficiado pelos problemas judiciários da Benetton e Schumacher, dava contornos de realidade a um título que sempre soou surreal. Na corrida seguinte, em Portugal, a ausência de Michael seguiria. O inglês repetiria o feito de Monza. Foi um fim de campeonato dos mais encarniçados de todos - infelizmente, às penas de uma punição ridiculamente exagerada ao alemão.

Não foi um ano tão ruim assim...
O fim, todos conhecem. Schumacher jogou o carro contra Hill e abrir caminho para os outros seis títulos. Começava a fama de Dick Vigarista, da qual nunca se livraria. A Williams voltava a incomodar após os meses de luto pela morte de Senna, mas seria em vão. A arrancada só daria resultados em 1996.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

O bom filho à casa torna?


A silly season chegou com tudo. Transferência, contratações, demissões, tudo vira assunto e notícia na época do ano em que os rumos de 2015 terminam de ser traçados. São dias tensos e bem interessantes. Particularmente, essa dança das cadeiras nas vagas da F1 é um dos fenômenos que mais chama minha atenção, muito embora a maioria dos boatos não tenha sustentação nenhuma - como o próprio termo indica.

Falemos de rumores, então. Basicamente, tudo gira em torno de duas equipes: McLaren e Mercedes.

A equipe inglesa já não quer mais Jenson Button, veterano, e quer alguém melhor para guiar o retorno da Honda à F1. Vettel e Alonso foram mencionados. Sebastian me parece uma aposta meio surreal, já que a Red Bull dá sinais de recuperação, após um 2014 decepcionante, e o alemão não vai romper seus laços históricos a troco de banana. Já Fernando poderia tentar: a Ferrari não está indo para lugar nenhum e faz uma temporada ridiculous. Complicado é que o relacionamento do espanhol com Ron Dennis nunca foi nenhuma maravilha. A BBC relatou que as conversas entre o asturiano e os prateados existem. Fiquemos de olho. Magnussen, novo e promissor, não se vê ameaçado. É um protegido da equipe de Woking.

A Mercedes vive dias cinzentos. Num clima que vai durar por um bom tempo, Hamilton e Rosberg disputam vitórias com a faca nos dentes e se veem como inimigos mortais. Nessas condições, não é difícil imaginar qualquer um dos dois pulando fora da barca, mesmo que a barca em questão seja a melhor de todas. O curioso, nesse caso, é que ambos tem contratos para 2015. Rosberg tem até 2016, aliás. Mas será que os dois querem ficar? Se um sair, será uma vaga disputada a tapa.

Imagino que Rosberg queira ficar, pelo menos. Está lá há cinco anos, é seu nicho. Por mais que tenha arranjado alguns problemas com a cúpula da equipe não sinto desejo algum da parte dele de debandar, ainda mais com seu contrato recém renovado.

Mas Hamilton já é diferente. Criou-se em uma outra casa e foi para a turma alemã numa decisão que surpreendeu a todos. Logo no segundo ano, todos os problemas possíveis com aquele que era um amigo de infância. Aí fica difícil. Deve estar sentindo falta do antigo empregador. A McLaren. Ligue os pontos com o terceiro parágrafo.

Saudades?
A princípio não existe nenhuma conversa entre as partes, mas faz sentido. Hamilton, acuado, deve estar com saudade de um lugar onde era mais valorizado e sofria menos com rivalidades. Ron Dennis, seu tutor, voltou nesse ano. A McLaren precisa de um piloto para liderar o projeto com a Honda. Num mundo em que Vettel e Alonso, são semi-deuses, seria mais fácil apostar em alguém tão bom quanto (ou um pouco menos) e que já tenha algum retrospecto positivo em Woking.

Os dois lados lidariam com boas chances de ter sucesso. A McLaren teria seu "líder", que desfrutaria das benesses de uma parceria que promete bastante. Seria uma identidade importante num período de reconstrução da equipe inglesa. Já Hamilton, fã de Senna, poderia se sentir ainda mais perto da condição de seu ídolo.

Repito: isso é tudo um exercício de imaginação. Nada é concreto, tudo é aberto e possível. Mas essa possibilidade em especial me soa interessantíssima. Seria o grande barato de 2015.

Ficam aqui os votos do autor. Espero que Ron Dennis leia meu blog.

terça-feira, 26 de agosto de 2014

O novo Rosberg


Nico Rosberg é o grande tema da semana. O alemão supostamente bateu de propósito em Hamilton, ocasionando um furo no pneu e outro nas chances de diminuir a vantagem do companheiro no campeonato de pilotos. O germânico também foi prejudicado, mas em um nível muito menor. Ainda conseguiu levar 18 pontos para casa.

Ficou provado que Rosberg não é mais aquele cara burocrático e meia-boca de outras temporadas. A transformação vem acontecendo desde sua chegada na Mercedes, em 2010, e atingiu seu clímax. Nico, hoje, é capaz de ser um completo canalha, se preciso for. Não que isso seja 100% errado: campeões costumam ser assim. Senna e Schumacher eram, por exemplo.

A surpresa de 2014 é que Rosberg mostrou velocidade durante o ano todo. Fez sete poles contra quatro de Hamilton. Foi também mais constante, tendo ido ao pódio dez vezes e abandonando só uma. Fez 73% dos pontos possíveis É, sem dúvida, desempenho de campeão. Em 2013, com o mesmo número de corridas, Vettel tinha conseguido 74%. Diz muito. Mas Nico nunca tinha mostrado a atitude de um vencedor.

Começando a ter problemas
Um cara rápido é só um cara rápido, não necessariamente um vencedor. Essa competitividade que tomou o alemão ao longo dos últimos tempos pode fazer a diferença. Correr o risco de bater no rival de propósito é muito cretino, mas pode ser necessário. Prost poderia ter perdido o título de 1989 se não fosse cretino. O mesmo vale para Senna em 1990 e Schumacher em 1994. Alonso foi sacana em Hockenheim/2010, mas não obteve sucesso. Foi um risco que não se pagou, paciência.

Não quero dizer que é certo, preferível tomar atitudes duvidosas em detrimento de outros, mas pode ser necessário. Seria muito mais bonito ver Rosberg passando por fora na Combes e ganhando o GP da Bélgica com Hamilton colado atrás. Mas o acidente foi a forma encontrada por Nico. Talvez tenha achado necessário marcar território após os problemas na Hungria - a função do rádio, a fechada de Lewis na últimas voltas (que acredito ser o "ponto" mencionado pelo filho do Keke). Moralmente é errado, mas moral e boa conduta não dão títulos para ninguém.

Passado Remoto
As consequências do alemão não terminam aqui. Ainda temos sete corridas pela frente, uma com pontos dobrados, e veremos muita lenha queimando. Toto Wolff, Niki Lauda e Paddy Lowe tem um problema gigante nas mãos. A zona de conforto já não existe mais, erros significam derrotas. Ricciardo está só esperando as chances, enquanto as flechas de prata se autodestroem. E o culpado de o que quer que ocorra será Rosberg, o vilão da história.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

O preço da liberdade


Bernie Ecclestone conseguiu se livrar de uma grande encrenca. Arranjou um acordo com a Corte de Munique, ao pagar módicos US$ 100 milhões, garantindo sua liberdade e inocência. Assim, o inglês mantém sua influência e poder dentro da F1 pelo tempo que der e quiser. É o fim da novela sobre suborno, um processo que vem se arrastando ao longo dos últimos anos.

A história é a seguinte: Ecclestone subornou Gerhard Gribkowski, visando facilitar um processo de venda de ações da F1. Bernie preferia que o grupo CVC fosse escolhido e o pagamento ao banqueiro, ilegal, foi a garantia para que o negócio fosse fechado. Para alguém que viveu em um mundo de dinheiro e poder, uma graninha aqui e outra acolá não fariam diferença nenhuma. É o mundinho do chefão. Quem não gostou muito disso foi a justiça alemã quando descobriu a função.

Não deixa de ser curioso que um pagamento tenha servido para garantir liberdade a Bernie, praticamente o mesmo processo que o levou aos tribunais, mas agora dentro da lei e correto. Uma vez mais, o dinheiro foi a base de seu sucesso - seja na venda de ações, seja no tribunal. Não me atrevo a discutir a decisão da corte, não tenho a base jurídica para abordar o caso, mas soa estranho que a sua inocência tenha sido garantida através do método mencionado. Ainda mais se considerarmos que Gribkoswki já foi julgado e está cumprindo pena por corrupção. Como se só um lado da moeda tivesse sido punido.

Bernie says: "think before you bribe"
Bem, nós não temos motivos para nos surpreender. Bernie sempre agiu desse jeito, todo o seu poder não é por acaso. O homem forte dentro desse mundo mesquinho da F1 tem que saber como jogar - e ganhar - o jogo. Mas não deixa de manchar a imagem do esporte e da entidade, trazendo assuntos particulares da administração da Formula One Management (FOM), à grande mídia. Além de fazer pensarmos que todos lá dentro são assim... oh, wait.

Podemos achar o baixinho um grande canalha, responsável por tudo de ruim que acontece com a categoria, mas ele não dá muita bola. É muito mais fácil para Bernie viver em um mundo a parte - em que redes sociais são uma "moda passageira" e relargadas paradas após safety-car são uma boa ideia - do que encarar a realidade de que a F1, mais do que um negócio, é um esporte e não envolve suborno e negociatas. Pelo menos deveria ser assim.

Não quero entrar no senso comum de dizer que no começo não era uma categoria cara. Claro que era, mas em outros níveis: para competir, você podia gastar muita grana construindo um bólido ou comprando um. Para os níveis quase amadores dos anos 50 e 60, era bastante. A F1 amadureceu, profissionalizou e virou o que é hoje: um lugar onde gastar milhões é normal.

Quatro Rodas de fevereiro de 1977. Não é de hoje.
Não acho que esse seja o maior problema (apesar de concordar que os custos atuais estão fora da realidade), o ponto é que todo esse dinheiro passa de mão em mão de maneiras que eu não me atreveria a imaginar. As relações entre as equipes e a FOM - e Bernie, por tabela - tendem ao obscuro, ao errado. A história da propina pode ser só parte de um universo muito maior que talvez nós nunca conheceremos.

Para nós pode soar absurdo pagar milhões para seduzir e mudar as opiniões de alguém, mas para Bernie esse uso e ciclo de dinheiro é normal. Ele faz isso desde quando assumiu a Brabham, lá no começo dos anos 70. Não é certo, mas é o real, corriqueiro.

Ver o inglês conseguindo comprar sua liberdade é o irreal, ainda. Mas faz parte da sua vida. Uma pena, se lembrarmos que uma pessoa tão duvidosa tem o nosso esporte favorito na palma da mão.

domingo, 3 de agosto de 2014

Rubinho é mais feliz que nós

(Foto: Bruno Terrena)
Hoje foi um dia movimentado para os fãs de automobilismo. Aconteceu a Corrida do Milhão, etapa mais importante do campeonato mais importante do Brasil. Se você acordou antes do meio-dia, já deve saber o resultado da disputa: Rubens Barrichello venceu sua primeira corrida na Stock Car. A cereja do bolo foi uma disputa insana entre o quarentão e Thiago Camilo, que mostrou muito mais ritmo ao longo dos cinquenta minutos, mas não soube transformar a vantagem em um milhão de reais.

É a primeira vitória de Rubens desde o GP da Itália em 2009, ainda nos dias de Brawn GP. Desde então, foram dias amenos numa Williams decadente, um ano como coadjuvante nos Estados Unidos e mais um tempo meia-boca na Stock Car. Era um rumo aceitável para alguém que já não é nenhum rapaz e que se preocupa mais com o crescimento e sucesso dos seus filhos. Ninguém poderia cobrar muito dele, ele estava se divertindo com aquilo que faz desde os anos 80. Hoje, todavia, Barrichello foi capaz de surpreender.

O que vimos foi uma alma sendo lavada. Não que Rubens ainda tivesse que provar algo para nós, mas se imaginava que ele seria mais vencedor na Stock. Temos essa imagem de que a categoria nacional é fraca, amadora e que qualquer um com experiência na Europa poderia vencer com três pneus. Ainda mais alguém que tem quase vinte anos de F1 no currículo.

Só gente ruim
Bem, não é tão fácil assim. Não mesmo. A Stock Car tem pilotos que poderiam ser bem sucedidos em muitos outros campeonatos de turismo no mundo. Pizzonia, Zonta e Burti já estiveram na F1; Maurício, Wilson, Suzuki e Bia Figueiredo tiveram sucesso no exterior; Cacá e Popó Bueno, Camilo, Serra e Abreu são nomes tradicionais do automobilismo brasileiro; Nunes, Foresti e Fraga são jovens que, infelizmente, não conseguiram bancar uma carreira mais longeva na Europa. Todos são pilotos com potencial, para fazer o público engolir o preconceito com o certame.

Ver um cara com 42 anos como o Rubinho bater de frente com esse povo todo não é pouca coisa. Sendo mais rápido que gente com metade de sua idade, que não era nem viva quando ele corria pela Jordan. Quase como se o tempo não passasse para Barrichello. E ainda assim tem gente que o vê de forma pejorativa

E esse jeito de ver o Rubinho vai muito além. Qualquer brasileiro sabe do que eu estou falando. Rubinho sempre chega em segundo. Rubinho deixa os outros vencerem. Rubinho sempre inventa desculpa. Rubinho é chorão. Rubinho é uma pessoal mal resolvida. Rubinho é frustrado.

Uma pessoa frustrada e infeliz
Sim, claro. Barrichello tem 42 anos e não pensa em se aposentar: faz a mesma coisa há trinta anos e não cansou nem se aborreceu. Teve a oportunidade de pilotar os melhores bólidos da história da Ferrari. Venceu onze GPs, disputou mais de trezentos, um recorde. Não foi campeão quando teve carro para isso (2000-2004), assim como os péssimos (cof cof) Coulthard e Montoya - assim como todos naqueles anos, derrotados por Schumacher. Tem dois filhos que se dão muito bem com o pai. Tem milhões na conta bancária - número que hoje mesmo cresceu mais um pouco.

Eu não tenho a menor dúvida de que ele é mais feliz que eu. Mais que você, também. E bem sucedido. Não porque sua vida, leitor, é uma merda ou algo assim, mas porque a dele é muito boa - e ele deve estar cagando e andando para as piadinhas e brincadeiras. Na posição dele, eu estaria.

Você pode continuar achando ele um derrotado por qualquer motivo que seja. Azar. Se eu pudesse, trocaria de lugar com ele sem pensar duas vezes. E você provavelmente também. Hoje, em especial, Rubinho é uma das pessoas mais felizes do mundo.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Os dias contados de Vergne


Jean-Éric Vergne é um caso curioso dentro da F1. Não é considerado o futuro da categoria, não é um talento que deslumbra espectadores ao redor do mundo. Mas faz o seu trabalho direitinho, pontua sempre que dá - apesar de não ter o costume de render bem em voltas rápidas. Esse ano, por exemplo, vem batendo Daniil Kvyat que, apesar de novato, é bastante rápido e promissor. Em 2012, bateu o hoje consagrado Daniel Ricciardo. No geral, é uma carreira digna de aplausos, desde a base até o pináculo do automobilismo.

Apesar dos prós, Vergne não está na condição mais confortável do mundo em 2014. Já está em sua terceira temporada com a Toro Rosso, que tem o péssimo hábito de demitir os pilotos sem mais nem menos, assim que percebe que eles não serão o próximo Sebastian Vettel. Jean-Eric viu seu grande parâmetro, Ricciardo, alcançar uma vaga na Red Bull e ganhar a condição de estrela. De certa forma, o francês foi visto como o derrotado pela cúpula de sua equipe, como se não fosse capaz de lidar com as responsabilidades de uma escuderia campeã. E acusou o golpe, passando a segunda metade de 2013 em branco, após um começo de ano promissor. Ali seu futuro pode ter sido definido.

Batendo o Ricciardo, quem diria?
É que na Toro Rosso os fracos não têm vez. Existe um punhado de jovens loucos por uma chance na categoria-maior e que, justamente por serem membros do Red Bull Junior Team, veem na equipe italiana a única oportunidade de pilotar um F1. Vergne, de certa forma, só está ocupando um espaço que é destinado ao desenvolvimento de novos pilotos para, quem sabe, servir à Red Bull. E ele dá claros sinais de que não seguirá esse caminho.

Já são três temporadas guiando os carros de Faenza, tantos anos quanto Buemi e Alguersuari. E vocês sabem o que aconteceu com a antiga dupla ao fim do terceiro ano: demissão. E olha que duraram bastante: Liuzzi, Speed e Bourdais demoraram menos ainda para garantir o seguro desemprego. Ao contrário da Ferrari ou da Mercedes, a Toro Rosso não é conhecida pela longa duração dos contratos.

Isso é uma grande pena. Mesmo. Vergne deu um show no GP da Hungria, segurando carros muito mais rápidos e que poderiam brigar pela vitória. É um piloto mais maduro, que vem tentando corrigir seus erros e defeitos de outrora. Pena que, creio eu, seja muito tarde. Acho que ele só não foi chutado em 2013 para que a STR não fosse obrigada a contar com dois novatos numa temporada com carros tão diferentes como a de 2014. Está lá para ser um parâmetro para Kvyat, não muito mais que isso. E ao  fim do GP de Abu Dhabi desse ano, esse dever estará terminado.

Quase uma babá
Mas vai sair para entrar quem? Bem, Carlos Sainz Jr é o nome mais provável. Já vem sendo cogitado na Caterham, ainda nesse ano, como parte do processo de amadurecimento (Ricciardo passou por isso com a Hispania em 2011). Daí em 2015 ele vai para a equipe júnior dos energéticos. Existem outros nomes bons no Red Bull Junior Team, mas creio que já seriam apostas para 2016 ou 2017 - Alex Lynn e Pierre Gasly.

É triste, mas não é novidade. As chances de vermos Vergne na F1 em 2015 vão diminuindo, mesmo que seus resultados venham crescendo. É o jeito da Toro Rosso de trabalhar.